Conheça os aspectos jurídicos por trás do gaslighting, termo mais buscado em 2022 na internet

A expressão “gaslighting” ganhou ainda mais espaço recentemente após ser a mais pesquisada em 2022. De acordo com o dicionário norte-americano Merriam-Webster, que a elegeu como a palavra do ano, as buscas tiveram um aumento de 1.740% este ano, em comparação com 2021.

Sem equivalente na língua portuguesa, ela é descrita pelo mais famoso dos dicionários americanos como “manipulação psicológica de uma pessoa, geralmente por um longo período de tempo, o que faz com que a vítima questione a validade de seus próprios pensamentos”. 

O termo surgiu em 1938, em uma peça teatral do dramaturgo britânico Patrick Hamilton para descrever um abuso psicológico praticado de forma velada, onde o abusador desacreditava a vítima, que duvidava de si própria indo à loucura.

De acordo com as sócias do escritório Lemos & Ghelman, Bianca Lemos e Débora Ghelman, “o gaslighting é compreendido como uma forma velada de manipulação psicológica por um abusador, que tem o objetivo de fazer crer sua inocência, desqualificando os argumentos da vítima que acaba, muitas vezes, taxada de louca”, explicam.

Trata-se de uma violência psicológica e sutil que, quando realizada entre um casal, está no rol de formas de violência doméstica previstas pela Lei Maria da Penha. A violência doméstica e familiar contra mulher é entendida pelo art. 5° da Lei Maria da Penha como ‘qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial’. Nesse sentido, ela independe de parentesco e, na maioria das vezes, ocorre de modo combinado com outras violências abarcadas pela violência doméstica – como a física, patrimonial e emocional, encaixando-se nesse conceito o gaslighting.

A advogada Bianca Lemos explica que “o gaslighting é muito difícil de identificar, especialmente pela sua atuação ser tão sutil. Mas, normalmente, há uma culpabilização da vítima, colocando-se sempre a mulher como louca. Outra característica típica é a mentira convicta, fazendo a vítima do gaslighting até se questionar se o que pensava era isso mesmo ou se, de fato, não está ‘ficando louca’ ou ‘inventando coisas na sua cabeça’. Esse tratamento cria na vítima muitas vezes uma situação de dependência com o agressor, justamente por afetar diretamente a autoestima da vítima”.

A violência psicológica é sempre muito difícil de se provar documentalmente. Mensagens de texto e voz nas redes sociais e em aplicativos de mensagens podem ser uma boa fonte de comprovação de tortura psicológica. Infelizmente, essa tortura ocorre oralmente e no âmbito privado do casal. Débora Ghelman enfatiza que “em casos de denúncias, se possível, o arrolamento de testemunhas que tenham presenciado a violência psicológica contra a mulher também ajuda a comprovar o abuso. Uma perícia psicológica, dependendo do caso, também pode ser requerida. Vale destacar que, em casos de violência doméstica, a palavra da vítima tem muito peso e o princípio do in dubio pro réu é relativizado exatamente pelo fato dos casos desse tipo de violência se darem no âmbito privado”.

gaslighting como uma violência psicológica contra a mulher pode gerar inúmeros e irreparáveis danos às vítimas. Por exemplo, a mulher pode acabar desenvolvendo sintomas característicos da depressão, da ansiedade, além de fobias sociais, insônia, distúrbios alimentares etc. Isso tudo sem contar as consequências que esses danos por si acabam por desencadear.

As sócias da Lemos & Ghelman finalizam explicando que “gaslighting, por ser uma prática típica de violência psicológica contra a mulher, pode ser denunciado em diversos canais disponibilizados especificamente para esse tipo de denúncia como as delegacias especializadas de atendimento à mulher, o Disque Denúncia (Ligue 197), a central de atendimento à mulher (Disque 180), na defensoria pública, dentre diversos outros órgãos”.

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